"Nas ruas estreitas da cidadezinha alemã de Arnstadt não se via mais ninguém. Era tarde. A quietude das casas e as luzes apagadas mostravam que o pacato povo do lugar já se achava recolhido.
Na igreja de São Bonifãcio, porém, uma candeia permanecia acesa e sua claridade mortiça iluminava indistintamente o rosto sereno de um moço de dezoite anos que, sentado diante do majestoso órgão, olhava-o quase com ternura, como se não fosse um instrumento, mas um velho companheiro.
Johann Sebastian Bach sentia-se em paz naquele ambiente tranquilo da igreja vazia. Gostava de vir ali e improvisar demoradamente, pelo puro prazer de dar forma aos sons e ouví-los ganharem sentido. Quando seus dedos fortes e ágeis escolheram as teclas e seus sapatões empoeirados se firmaram nos pedais, poderosos acordes inundaram a nave deserta, tecendo a elaborada trama de um solene hino ao amor e à fé.
Uma expressão enlevada moldava agora o rosto do rapaz, que desenvolvia sem interrupção um tema após outro, executando inspiramente e sem nenhum esforço as complexas invenções da sua criatividade. Nem o passar das horas, nem o sono, nem o cansaço pareciam incomodá-lo, tão absorvido estava em sua divagação musical. E foi com surpresa que viu os primeiros raios de sol filtrando-se pelas janelas. Sem perceber, havia atravessado a madrugada ao órgão.
O cargo de Organista da Igreja de São Bonifácio, não lhe exigia tanto. Todavia, para Bach, a música não era apenas um ofício, mas uma necessidade interior, surgida em sua juventude e à qual ele se entregou durante toda a vida.
Não foi menino-prodígio: sua carreira se fez lenta e laboriosamente. Tão pouco foi rebelde e inovador de padrões estéticos: estudou a música da sua época, dominou-a com maestria e através dela exteriorizou genuinamente a sua personalidade. Era homem do povo e usou elementos populares como base para aquilo que compunha. Luterano por formação, impregnou sua obra com a religiosidade singela e profunda que lhe era própria. Amando a ordem, o equilíbrio e a perfeição, criou uma arte ordenada, equilibrada e perfeita. Como músico, da mesma forma que como homem, Johann Sebastian Bach foi sempre fiel às suas origens, à sua natureza e às suas convicções.
Seus contemporâneos o respeitaram como instrumentista versátil e competente, mas não o perceberam o brilhantismo do seu talento de compositor. Somente a posteridade reconheceu nele um gênio assombroso, que aproveitando os componentes mais ricos da arte musical do século XVIII, utilizou-se como meio de expressão pessoal, e exclusiva, para realizar uma obra gigantesca, que o imortalizou como um dos maiores mestres da música de todos os tempos."
datas e fatos relevantes
1685 - Nasce em Eisenach, a 21 de março, filho de Johann Ambrosius Bach e Elisabeth Laemmerhirt.
1695 - Com amorte do pai, J. S. Bach vai residir com seu irmão mais velho, em Ohrdruf, realizando grandes progressos no estudo musical.
1701 - Toma lições de órgão e começa a compor para este instrumento.
1703 - Torna-se organista da Nova Igreja de Arnstadt
1707 - Organista da Igreja de São Brás, em Muehlhausen. Casamento com Maria Bárbara, sua prima, a 17 de outubro.
1708 - Poe-se a serviço do duque, em Weimar, como músico de câmara e organista. Nascimento do primeiro filho.
1717 - Passa a servir o Príncipe Leopold, em Coethen, após sérias desinteligências em Weimar.
1720 - Casamento com Ana Magdalena Wicken. Ele com 36 anos, ela com 20.
1723 - Transfere-se para Leipzig, com músico e professor.
1729 - Primeira apresentação da Paixão Segundo São Mateus.
1740-1741 - Primeiros problemas com a visão.
1750 - Morre a 28 de julho.
Ouça - Cravo Bem Temperado!
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